ERROS COMUMENTE ENCONTRADOS NOS
LIVROS DIDÁTICOS DO ENSINO FUNDAMENTAL
Roberto Boczko
INTRODUÇÃO
Uma rápida folheada num livro, pretensamente didático, destinado ao Ensino Fundamental, seja de Geografia, ou seja, de Ciências demonstra, geralmente, um grande número de erros, de imperfeições, de omissões e/ou de desatualizações na parte referente à Astronomia.
O mais grave dessa situação é que os livros são usados tanto pelos alunos como pelos professores, sendo, muitas vezes, o único livro de referência disponível. Assim, o professor aprende errado, ensina errado, o aluno se torna professor e o ciclo da ignorância se fecha e perpetua.
Esperamos poder mostrar quais os erros mais comumente encontrados nos livros didáticos destinados aos alunos e professores do Ensino Fundamental.
PONTOS CARDEAIS
Um dos erros mais comuns é aquele que afirma que o ponto leste é aquele em que o Sol nasce. Bastariam alguns dias de observação para se verificar a tolice envolvida nessa afirmação. Na verdade, o Sol nasce no ponto leste no máximo duas vezes por ano: nas datas dos equinócios.
O Sol nasce no lado leste, mas nem sempre no ponto ou na direção leste.
A determinação dos pontos cardeais deve começar com a determinação do meridiano local, sendo que para isso bastam observar a direção das sombras de uma vara vertical em dois instantes tais que essas sombras tenham os mesmos comprimentos. A bissetriz interna do ângulo formado por essas sombras define a direção do meridiano. A linha horizontal perpendicular ao meridiano define a direção leste-oeste. O ponto leste é o do sentido dessa última linha que aponta para o lado leste. Os demais pontos cardeais são obtidos facilmente a partir do conhecimento de um deles.
Outra informação errada: o braço maior do Cruzeiro do Sul aponta para o sul. Em primeiro lugar, seria mais indicado que se dissesse corpo da Cruz, e não braço. Prolongando-se 4,5 vezes o corpo da Cruz, no sentido dos pés da Cruz, obtemos o Pólo Sul. Baixando, pelo Pólo Sul, a linha perpendicular ao plano do horizonte, obtém o ponto cardeal sul, e daí os demais pontos cardeais.
CONSTELAÇÕES
Constelação NÃO é um conjunto de estrelas próximas umas das outras. Constelação é um conjunto convencional de estrelas ao qual se associou uma figura real ou mitológica. As estrelas de uma constelação podem estar, linear ou angularmente, muito distantes uma das outras.
SIGNOS E CONSTELAÇÕES ZODIACAIS
Constelações zodiacais são aquelas pelas quais o Sol, durante o seu movimento anual aparente, parece passar. São, por convenção, 12 constelações. Cada uma dessas constelações possui um tamanho diferente.
Signos zodiacais são 12 casas, cada uma com 30 graus de comprimento, começando no instante em que começa a primavera boreal.
Há cerca de 4000 anos, as constelações e os signos zodiacais mantinham uma correlação aproximada. Por causa do fenômeno da precessão, o ponto do céu onde se encontra o Sol no instante do início da primavera boreal vai se deslocando no sentido oposto ao do movimento anual aparente do Sol, de modo que esse ponto vai mudando com relação às constelações zodiacais. Isso acarreta uma defasagem entre o signo e a constelação zodiacal homônima que, atualmente, é de uma constelação.
ESTAÇÕES DO ANO
Talvez o erro mais grave e comum seja o de definir que as estações do ano ocorrem por causa da variação da distância da Terra ao Sol ao longo do ano.
Sabe-se que a causa principal das estações do ano se deve à variação de calor recebida pelos diferentes hemisférios da Terra em função das diferentes posições desses hemisférios com relação ao Sol. Essa postura de cada hemisfério com o Sol se deve ao fato de o eixo de rotação da Terra se manter, durante alguns anos, praticamente paralelo a uma mesma direção fixa do espaço e estar inclinado de cerca de 66,5 graus com relação ao plano orbital da Terra.
Um erro comum é o de afirmar que o eixo de rotação da Terra está inclinado de 23,5 graus, mas não dizer que essa inclinação é a do eixo de rotação com relação à direção perpendicular ao plano orbital da Terra.
SOMBRA DE UM CORPO AO MEIO-DIA
Contrariamente ao que muitos livros afirmam, a sombra de um poste não é um ponto ao meio-dia.
Para locais contidos entre os trópicos, podem ocorrer, no máximo, dois dias por ano em que a sombra de um poste vertical, ao meio-dia, é um ponto.
Para locais sobre os trópicos, isso pode ocorrer no máximo uma vez por ano, na data do solstício do verão correspondente.
Para locais fora da região intertropical, nunca a sombra de um poste vertical é um ponto ao meio-dia.
Tudo o que se pode afirmar é que, ao meio-dia verdadeiro, a sombra de um poste vertical é a mais curta do dia.
"PONTAS" DAS ESTRELAS
Um dos erros mais comuns é o de representar as estrelas com "pontas". Deveria haver em algum lugar da obra a informação de que as estrelas são esféricas e que as "pontas" são fenômenos ópticos (cintilações) criados pela atmosfera da Terra conforme a luz vinda das estrelas a atravessa.
O SOL É UMA ESTRELA DE QUINTA GRANDEZA
Apesar de essa afirmação ser correta, na maior parte das vezes ela é totalmente desprovida de valor já que nem professor nem aluno sabem que grandeza é uma medida de brilho e não de tamanho, além de que, a magnitude a que se refere é a absoluta e não a aparente. A afirmação só teria significado se o livro explicasse a classificação de Hiparcos para magnitudes aparentes e absolutas.
ESTRELINHAS COLOCADAS ENTRE AS ÓRBITAS DOSPLANETAS DO SISTEMA SOLAR
Pode-se passar uma idéia errada das distâncias envolvidas entre o Sol, os planetas e as estrelas ao se desenhar estrelas por entre as órbitas dos planetas do Sistema Solar. Sempre se pode contra argumentar dizendo que são estrelas de fundo, mas o estrago conceitual já está feito. Ou se explica o fato junto à figura, ou ficará muito difícil corrigir o erro mais tarde.
"TAMANHO"
É desprovida de valor a afirmação de que o tamanho de tal astro é 11 vezes maior que o de outro astro se não se explicar à grandeza a que tal tamanho se refere: raio, massa, volume, etc.
NÚMERO DE ANÉIS E SATÉLITES
Um erro comum de desatualização é o de citar que Saturno é o planeta dos anéis quando na verdade sabe-se que os 4 grandes planetas (Júpiter, Saturno, Urano e Netuno) os possuem.
Quando se cita o número de satélites naturais de um planeta, deve-se adicionar a informação de que aquele é o número conhecido até a data da conclusão da obra, e que, devido ao crescente poder de detecção de astros, esse número tende a crescer.
CONFUSÃO ENTRE A DURAÇÃO DO DIA E O PERÍODO DE ROTAÇÃO DA TERRA
O período de rotação da Terra, ou seja, o tempo para que ela gire de 360 graus em torno de seu próprio eixo, é de cerca de 23h56m04s, ou seja, cerca de 03m56s mais curto do que a duração média do dia, já que para este último caso, contribui tanto o fenômeno de rotação como o de translação.
NÚMERO DE MOVIMENTOS DA TERRA
Deve-se lembrar que a Terra possui um único movimento, que é o movimento que ela tem. Esse movimento pode ser decomposto em diversas componentes com características bem definidas.
Atualmente conhecem-se os seguintes movimentos: rotação, translação, precessão, nutação, movimento dos pólos, movimento espacial do Sol com relação às estrelas da Galáxia e movimento de rotação da Galáxia.
Só da nutação são conhecidos 106 movimentos diferentes, com períodos que vão de cerca de 19 anos até alguns de poucos dias.
TAMANHOS E ÓRBITAS DOS PLANETAS
Nos esquemas representando os planetas e suas órbitas em torno do Sol, deveriam constar que os tamanhos e distâncias não estão em escala por motivos técnicos. Além disso, quando o esquema estiver em perspectiva, tal fato deveria ser mencionado, já que nesse caso as órbitas aparecem como elipses bastante achatadas, o que não representa o fato real (as órbitas dos planetas, com exceção de Plutão são quase que circulares).
PROVAS DOS MOVIMENTOS DE ROTAÇÃO E DE TRANSLAÇÃO DA TERRA
Nem Kepler, nem Galileu provaram que a Terra se move. Eles apenas afirmaram tal fato, mas sem provar nada. A prova do movimento de rotação da Terra só foi dada por Foucault em 1852, através da experiência do Pêndulo que leva seu nome.
Da mesma forma, a prova do movimento de translação da Terra só foi dada por Bradley, em 1726, através da descoberta do fenômeno da aberração das estrelas, o qual só podia ser explicado através da imposição de que a Terra girasse em torno do Sol.
ROTAÇÃO DA LUA
Apesar de a Lua mostrar sempre a mesma face para a Terra, isso não quer dizer que ela não possua movimento de rotação. Ela possui um movimento de rotação que é síncrono com seu movimento de translação em torno da Terra. Isso significa que ao mesmo tempo que gira em torno de seu eixo ela gira em torno da Terra. O seu movimento de rotação pode ser detectado ao se observá-la com relação às estrelas.
Outro erro comum é afirmar que o período de rotação da Lua é de 29 dias. O período de uma lunação, ou seja, o intervalo de tempo entre duas luas cheias consecutivas, é de cerca de 29,5 dias, mas o período de translação da Lua em torno da Terra é de cerca de 27,3 dias. Tal diferença ocorre devido ao fato de que as fases da Lua dependem não só de seu movimento de translação em torno da Terra, mas também do movimento de translação da Terra em torno do Sol.
FASES DA LUA
Fase, em grego, significa aparência. Assim, como a aparência da Lua muda a cada instante, não se pode dizer, cientificamente, que existem 4 fases. Em países de língua inglesa, por exemplo, definem-se 8 fases. Tradicionalmente costuma-se dizer que existem as 4 fases: Nova, Quarto Crescente, Cheia e Quarto Minguante, sendo que cada uma delas começa quando a Lua está com a fase homônima. Notar que desde o instante da fase de Nova até a fase de Cheia, a Lua está Crescente. Igualmente, desde a Lua Cheia até o instante de Lua Nova, a Lua está Minguante.
Na falta de uso adequado da terminologia, deve-se salientar que "cada" fase dura cerca de uma semana, mas que o aspecto da Lua muda todo dia.
Na representação das diferentes fases da Lua, os livros didáticos devem tomar o cuidado para representarem as "4 fases" da Lua conforme elas são vistas pelos habitantes do Brasil, já que o aspecto das Luas Quarto Crescente e Quarto Minguante depende do hemisfério do observador (na verdade depende da latitude do observador).
Outro problema a ser resolvido nos livros didáticos, é o da distinção entre fases da Lua e Eclipses. É comum apresentarem um Eclipse Lunar Total em lugar da Lua Nova, ou um Eclipse Lunar Parcial para explicar as fases de Quarto Crescente ou Minguante.
Como o plano orbital da Lua não coincide com a eclíptica, não é fácil representar e distinguir as fases da Lua e os Eclipses. O problema só pode ser resolvido se houver um bom desenhista apoiado por um astrônomo.
CONFUSÃO ENTRE METEORÓIDE, METEORO, METEORITO, ASTERÓIDE, PLANETÓIDE E COMETA.
Planetóides e asteróides devem ser vistos como sinônimos.
A distinção entre planeta e asteróide deve ser citada como sendo a diferença de tamanhos, já que suas naturezas e origens podem ser semelhantes. Não há um limite que separe planetas de asteróides. Asteróides são pequenos planetas, como bem o diz o nome planetóide.
O mesmo ocorre entre asteróides e meteoróides. Meteoróides são asteróides de dimensões muito reduzidas. São, na realidade, pedras que giram em torno do Sol e que, algumas vezes, colidem com a Terra ou outro astro maior. Em alguns casos, meteoróides podem ser partes de núcleos que restaram de cometas depois de passarem diversas vezes pelo seu ponto de máxima aproximação ao Sol.
Quando um meteoróide entra na atmosfera da Terra, e se aquece por causa do atrito com ela, ele emite luz e passa a se chamar meteoro ou, popularmente, estrela cadente.
Se parte do meteoro consegue atingir o solo, então ele passa a ser chamado de meteorito.
Um cometa possui características diferentes das dos asteróides, já que, geralmente, uma razoável fração de sua massa se encontra na forma de matéria congelada; ele pode apresentar uma cabeleira e, eventualmente, uma ou duas caudas, apenas quando se aproxima do Sol.
A afirmação de que cometas são astros que cruzam o céu deve ser encarada com cuidado, pois transmite a idéia de que é possível ver-se os cometas riscando o céu como se fossem meteoros.
CONFUSÃO ENTRE COSMOGONIA E COSMOLOGIA
A Cosmogonia estuda a origem e a formação do Sistema Solar a partir de uma nebulosa de gás e poeira.
A Cosmologia estuda a origem e a evolução do Universo como um todo.
O "big-bang" é uma teoria associada à origem do Universo e não à do Sistema Solar em particular.
CONCLUSÃO
Apesar de estar havendo uma melhora sensível nos livros didáticos destinados ao Ensino Fundamental, em parte graças aos esforços do MEC para a avaliação deles, ainda há muito o que se fazer para que os livros "didáticos" mereçam esse adjetivo.
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