4 de novembro de 2005

Trabalho sobre Aquisição de Linguagem

ontem participei de seminário sobre aquisição de linguagem no curso de metodologia. falei basicamente sobre a diferença entre o desenvolvimento (natural) da língua falada e a necessidade que existe de se aprender (com esforço) a lingua escrita - para tanto, não basta estar inscrito num universo de escrita, não basta ser um "bom leitor", e é justamente este "algo mais" que temos atualmente dificuldade de promover na escola.

apesar de não ser o autor dos textos que seguem, tomo a liberdade de publica-los aqui, já que colaborei na formulação do trabalho. espero que sirva para alguém:

Iniciamos nossa apresentação comentando uma notícia (que alguns julgaram ser uma piada):
Aquisição de Linguagem

Notícia publicada em 16 de maio de 2005 na página do jornal O Estado de São Paulo:
Tradutor da “fala” dos bebês será lançado em 2006

Pesquisadores da Nagasaki University, no Japão, devem lançar, em 2006, um dispositivo que traduz os estados de espírito e desejos dos bebês, revelados em seus choros e expressões corporais.
São Paulo - Uma equipe de cientistas japoneses, liderada pelo professor Kazuyuki Shinohara, da cadeira de Neurobiologia da Nagasaki University, com apoio da Japan Science and Technology Agency, estão desenvolvendo um dispositivo capaz de traduzir os desejos de bebês, revelados em seus choros e expressões coporais. Shinohara disse à agência de notícias France Press que já realizou uma série de experiências nesse sentido, com resultados animadores.”O que estamos fazendo é ler o rosto de um bebê matematicamente, por meio, por exemplo, da medição da distância entre as sobrancelhas e o nariz”, ele conta.O grupo tem analisado também a intensidade sonora do choro e a temperatura corporal (sobretudo do rosto) dos bebês, na tentativa de encontrar aí um padrão de comportamento. Shinohara não revelou as conclusões de sua pesquisa, mas adiantou que a novidade poderá ser usada em instituições de saúde ou em casa e que deve estar no mercado até o final de final de 2006, por cerca de 95 euros.Ano passado, a fabricante de brinquedos Takara fez muito sucesso com uma engenhoca que, segundo ela, interpreta os latidos dos cães. A invenção não foi levada muito a sério, o que não é o caso do tradutor do professor Shinohara, embora a comunida científica veja o aparelho com certa desconfiança.

Citação:
"Berges: É verdade que a criança entra na linguagem à força (...). Há o fato de que, entre a mãe e a criança, elas se compreendem, é uma língua tout a fait privada (...). Mas, num momento dado, a mãe fala com a voz da linguagem e o honrado garoto é obrigado a entrar lá dentro”. (Da conferência "Do Corpo à Letra" de Jean Berges e Gabriel Balbo (1994) copio o seguinte trecho de uma fala de Berges)

Porque falar de aquisição? (baseado em Lyons)
Razões práticas:
Baseando-se em uma melhor compreensão da aquisição da linguagem os terapeutas da palavra (psicólogos, fonoaudiólogos, psiquiatras etc.) podem diagnóstica e tratar as inabilidades relacionadas à linguagem, tanto em crianças quanto adultos.
O material didático pode ser melhorado se for dirigido, não apenas em termos de vocabulário, mas também em gramática, à competência lingüística do público alvo.
Auxilia professores e profissionais envolvidos com a educação a perceberem casos de surdez parcial, dislexia incipiente, retardamento mental ou qualquer outra deficiência de linguagem, facilitando o encaminhamento para tratamento.
Porque utilizar o termo ‘aquisição’ e não ‘aprendizado’ da linguagem?
Segundo o Dicionário Aurélio – Século xxi (eletrônico):
· Aprendizado: ato ou efeito de aprender, especialmente profissão manual ou técnica; estabelecimento de ensino técnico ou profissional.
Adquirir: passar a ter, vir a ter,
Aquisição: processo de desenvolvimento de língua materna em criança.
Desenvolvimento: adiantamento, crescimento, aumento, progresso.

Apesar de o termo aquisição já ser considerado como padrão, ele pode contrariar a idéia do inatismo. Sendo assim, devemos entender a linguagem (faculdade da linguagem – fatores biologicamente predeterminados) sob o termo desenvolvimento, entretanto, a língua precisa ser adquirida pelo sujeito inserido em uma determinada comunidade lingüística.

Citação: “O problema psicológico que mais interessa ao lingüista é a estrutura interna da língua em termos de processos psíquicos inconscientes, e não o da adaptação do indivíduo a essa estrutura tradicionalmente conservada”. (Sapir, p.32)


Do nascimento do sujeito falante: uma breve introdução às reflexões de Lemos
Não se refere aqui à fala como um acúmulo nem como uma construção de conhecimento e apresenta-se contra-evidências ao fato:
A primeira contra-evidência surge na heterogeneidade dos enunciados das crianças, o que aponta para uma oposição à graduação da aquisição de linguagem;
A segunda está explicitada no retorno nos enunciados da criança da fala de seu interlocutor;
E, por último os ERROS ocupam um lugar importante nesta reflexão, pois eles resultam de cruzamentos das falas dos outros em enunciados das crianças. Isto suscita a própria fala da criança, em detrimento da idéia de que ela adquire a fala enquanto apenas conhecimento e reconhecimento do outro.
Assim, Lemos contesta a solução gerativista proposta em Chomsky a respeito de um conhecimento prévio sobre a língua conceituada, como língua possível, localizada no cérebro / mente. Ao mesmo tempo em que deixa de compreender a relação do sujeito com sua língua como uma relação de sujeito e objeto, mas pelo contrário uma relação em que apenas com a língua o sujeito pode tornar-se sujeito, sujeito falante. Deste mesmo modo, abandona a visão sincrônica de Saussure também.
A idéia aqui seria não se apoiar apenas em teorias que colocam a linguagem como o principal elemento da aquisição, mas também que não enfatizem apenas o sujeito neste momento. Trata-se de aliar o sujeito psicológico com a instância da linguagem para que se obtenha uma boa compreensão do processo. Para tal, Lemos recorre à revisão de Lacan das teorias freudianas para explicar esta CAPTURA do sujeito pela linguagem, tratando-se de uma visão diacrônica.
Captura-significa a abreviatura dos processos de subjetivação por meio da língua, que dentro de seu funcionamento simbólico permite a ele ser significado, como significar outra coisa para além do que o significou.
A partir desta idéia de uma captura do sujeito pela linguagem, podemos falar em três posições do sujeito, posições estas que não são cronológicas ou graduais. A passagem do Infant para sujeito falante se dá pela posição que a criança ocupa na fala do outro, na língua e em sua própria fala.
Fala do outro - O outro que o significa, lhe dá um lugar através da fala;
Da língua – trata-se da dominância do funcionamento da língua;
Sujeito Falante - aquele que escuta e fala a sua própria fala, ao escutá-la a reformula e percebe a distância entre a sua fala e a fala do outro. Destaca-se a instância subjetiva que fala e a instância subjetiva que escuta de um outro lugar.

Especularidade

Há três processos básicos no diálogo, segundo De Lemos: especularida (identificação entre os sinais dos dois interlocutores), complementariedade (incorporação de parte ou de todo enunciado, ou gesto, do interlocutor e complementação criativa) e reversibilidade de papéis (assumir o papel do outro e instituir o outro como interlocutor).

Segundo Lemos Especularidade é:
Repetição com diferença: não há coincidência entre a fala da mãe e a fala da criança.

O que existe é uma estrutura triádica: em primeiro lugar a criança é falada pela fala do outro, ou seja, a fala da criança é parte da fala do outro, “outro” entendido como “instância de funcionamento da língua/discurso”, quer dizer, como falante. Ocorre que o significante pode ser o mesmo, mas o significado, para a criança, é indeterminado.

Em segundo lugar a criança é falada pela língua: a criança está no intervalo dos significantes postos em relação, faz articulações à revelia, embora fale, não tem escuta para o que diz.

Em terceiro o sujeito ficará sob o efeito da sua fala: divisão do sujeito entre fala e escuta.
A especularidade não é unilateral, pois é pela incorporação da fala da mãe que a criança pode falar, a mãe, por sua vez, só pode dar andamento ao diálogo a partir do fragmento incorporado pela criança.

Atenção: Não se trata de "fases", já que não são superáveis e, na verdade, esse fenomeno pode ser observado mesmo em adultos. Deve-se destacar que esta estrutura é mais importante na infância, pois constitui o "sujeito".

Bibliografia

Elliot, A. J. A linguagem da criança. Rio de Janeiro: Zahar, 1982.

Galves, C. "Princípios e Parâmetros e Aquisição da Linguagem". In: Cadernos Lingüísticos (29).Campinas: UNICAMP, 1995.

Lemle, M. Conhecimento e biologia.In: Ciência Hoje 182, maio 2002.
http://www.uol.com.br/cienciahoje/ch/ch182/cogni.htm

Lyons, J. Lingua(gem) e Lingüística – Uma Introdução. Rio de Janeiro: LTC, 1987.

MAGALHÃES, J. http://www.estadao.com.br/rss/tecnologia/2005/mai/16/118.htm

MUSSALIM, F. & BENTES, A. D. (Orgs). Introdução à Lingüística: Domínios e fronteiras – Volume 2. São Paulo: Cortez, 2001.

Piatelli-Palmarini, M. (Org.) Teorias da linguagem, teorias da aprendizagem: o debate entre Jean Piaget e Noam Chomsky. São Paulo: Cultrix, 1983.

Sapir, E. Lingüística como ciência. J. Rio de Janeiro: Livraria Acadêmica, 1961.

Skiner, B. F. Comportamento verbal. São Paulo: Cultrix, 1985.

Slobin, D. I. Psicolingüística. São Paulo: Nacional, 1980.

Vygotsky. Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins fontes, 1962.

http://www.unipinhal.edu.br/ojs/falladospinhaes/

3 comentários:

Anônimo disse...

Com respeito, cito a inconsequente redundancia na frase:
"o honrado garoto é obrigado a entrar lá dentro"
Lamentável.

ekalafabio disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
ekalafabio disse...

Curioso. O anônimo que comentou este post não leu o texto.

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